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11.8.04


"QUER UMA MÚSICA DE PRESENTE?"

Eu tinha dezesseis anos. Tava no segundo ano do Ensino Médio. Um período de socialização bacana. Eu não era das mais populares [como na época em que eu entrei pros D.A´s e comissões de formatura da faculdade], mas também não era um zero à esquerda [como na época do ensino fundamental, mais especificamente, da sexta à oitava série].

Eu era a “mina do cabelão”. Saía de vez em quando, era amiga do pessoal, sempre tinha grupo pra ficar ou alguém pra me acompanhar na hora do intervalo. Enfim... eu era absolutamente normal. Nada de mais, nada de menos.

No começo do terceiro bimestre, mais especificamente, essa mesma época de agora do ano, ele entrou na minha turma. Tinha se mudado pra cá vindo do interior. Se matriculou na escola, caiu na minha classe. E qualquer um que já tenha entrado em uma escola diferente no meio do ano letivo, sabe o quanto essa experiência pode ser traumática. E sim, eu sei.

Na hora que eu cheguei na sala, ele tava no meu lugar. Tá. Que é que eu faço? Mudo de lugar, expulso ele dali, sento do lado, na frente...???

Eu: Oi. Tudo bem?

Ele: Oi! Tudo!

Eu: Então... será que você se importaria de sentar aqui do lado? É que esse aí é meu lugar...

Ele: Ah claro! Eu imaginei mesmo que fosse de alguém, mas eu nem sabia onde sentar... todos os lugares já devem estar ocupados...

Eu: Não não... esse aí que você tá agora tá sempre vago. A mesa de trás também.

E eu me apresentei a ele. Ele se apresentou. Viramos “amiguinhos”, do tipo daqueles que conversam na hora do intervalo ou que pede pra comprar uma esfiha na cantina pra você. Quando ele ficava sem grupo, entrava no meu. Quando alguma amiga minha faltava e tinha atividade em dupla, fazíamos juntos.

Porém, digamos assim que... ele não era um menino lá muito bonito... O físico dele até que era bacana, apesar de comum: branquinho, magro, alto, uns braços meio fortinhos... Já de rosto... o garoto era um poço de espinhas... mas daquelas espinhas ESPINHAS, sabe? Aquelas bolotonas! Perebonas!

Ele fazia alguns tratamentos mas os hormônios dele não colaboravam muito. Mas o pior não era isso.

Era certo e verdadeiro que o sucesso dele com as mulheres era ZERO. Lembro que ele chegou a gostar de uma menina que fazia secretariado e recebeu um mega fora quando foi falar com ela. É incrível como os adolescentes podem ser cruéis!!! Não chegam a ser tanto como as crianças, mas conseguem reduzir a pó qualquer outro ser da mesma faixa etária.

Na nossa sala não era muito diferente. Ele vivia sozinho. Os meninos não se aproximavam muito dele porque ele era quietão. As meninas nem chegavam perto porque ele era feio pra caralho. Mas, convenhamos: bando de gente fútil que não consegue enxergar o que realmente há nas pessoas.

Eu tinha uma meia dúzia de amigas que não se conformava de eu andar com ele, conversar com ele, ficar na companhia dele de vez em quando na hora do intervalo... elas achavam um absurdo. Eu, sinceramente, me poupava da discussão. Era gastar saliva à toa.

Um dia ele me chamou pra uma balada. Ele me pegou num shopping e a gente foi. Apesar de nem ter 18 anos ainda, ele já dirigia e pegava o carro do pai... A gente foi num lugar que rolava basicamente uns sputs sputs e pop rock. Eu, já fazendo jus à fama de pinguça que me acompanha até hoje, enchi a lata! Manguacei! Enfiei o pé na jaca MESMO!!!

Num daqueles momentos de devaneio que são únicos e exclusivos dos bêbados, eu virei as pernas de um jeito meio estranho e quase caí... Ele me segurou pra que eu não desse com a cara no chão e ficou me abraçando...

Aí, adivinha o que a trêbada da noite aqui fez? Sim. Eu beijei o menino.

Beijei, beijei, beijei... e enquanto eu beijava eu pensava que ele era feio pra burro, mas que ele beijava bem pra caralho... e aí eu coloquei a minha mão por baixo da camiseta dele e senti uma barriga sequinha... e depois eu peguei na mão dele e vi que era uma mãozona bacana... E ele me deu uns abraços de urso e... Pensei: "Que que é esse negócio aqui??? AAAAAAAAAI! Meu Deus!!! Ele tá de pau duro!!!". E comecei a pensar seriamente em perder minha virgindade com ele. De preferência, naquela noite.

Fim de festa. Eu, pra lá de Marrakesh! À muito custo, consegui guiar o indivíduo até minha casa... depois de meia hora tentando abrir o portão, entrei em casa e simplesmente... APAGUEI.

Dia seguinte. Minha mãe aparece no meu quarto e diz que tem um menino no portão me procurando. Era ele. Saí de pijamas, sentei com ele na calçada. Conversamos um pouco, falamos do dia anterior, demos algumas risadas... Fiz questão de mostrar pra ele que eu lembrava de tudo pra ele não ficar achando que eu só fiz aquilo por que eu tava bêbada.

Tá. Eu só fiz aquilo porque eu tava bêbada mas ele não precisava saber. Ficamos falando, falando, falando... aí ele foi dentro do carro, tirou um violão e começou a afinar. Achei lindo ele ali, na porta da minha casa, tocando violão, falando das músicas que ele mais gostava... Umas duas horas depois ele foi embora. Era Domingo e a gente se encontrou de novo na escola, no dia seguinte.

Foi então que tudo mudou. O cara virou um grude. Mas um grude daqueles bem grudentos, sabe? Super Bonder era cola Tenaz perto dele! Ele ia atrás de mim na hora do intervalo, ficava me chamando o tempo todo, fazia a professora olhar feio pro canto onde a gente sentava de tanto que ele ficava cochichando...

Eu gostava dele, mas tava enchendo. Aí, numa das últimas provas, eu fui muito mal. Matemática. Ele viu aquele zero BEM redondo na minha avaliação e se ofereceu pra me ajudar. Eu tava tão na merda com essa matéria que não tive nem como negar. Lá vou eu pra casa do indivíduo estudar essa matéria maldita.

Cheguei lá e a mãe dele me tratava como se eu realmente fosse a futura nora dela. Talvez ela achasse que o filho fosse viado por nunca aparecer com mulher em casa. De repente, ela me via ali... era a certeza de que o filho dela era hétero... Whatever! Fomos pro quarto dele e começamos a estudar. Ele realmente me explicou uma série de exercícios... Mas na hora que eu tava indo embora, ele pediu pra eu esperar. Ele “queria me mostrar uma coisa”. Pegou o violão...

Ele: Ó... quer uma música de presente?

Eu: Quero!

Ele: Lá vai... “Se você quer ser minha namorada / Ah, que linda namorada / Você poderia ser... / Se quiser ser somente minha / Exatamente essa coisinha / Essa coisa toda minha / Que ninguém mais pode ser...”

Aí, eu dei aquela engolida a seco... Caralho, meu...!

Ele: “...Você tem que me fazer um juramento / De só ter um pensamento / Ser só minha até morrer / E também de não perder esse jeitinho / De falar devagarinho / Essas histórias de você / E de repente me fazer muito carinho / E chorar bem de mansinho / Sem ninguém saber porquê...”

Como assim... “Ser só minha até morrer???”

Ele: “...Porém, se mais do que minha namorada / Você quer ser minha amada / Minha amada, mas amada pra valer / Aquela amada pelo amor predestinada / Sem a qual a vida é nada / Sem a qual se quer morrer...”

Eu: Sei...

Ele: Vinícius de Moraes...

Eu: Sei... ó só... é é é é é é... preciso ir.

Ele: Tudo bem.

Eu: Valeu pela aula.

Ele: Vou te levar em c...

Eu: NÃO! Er... quer dizer... não precisa. Tá tudo bem... eu... eu... eu... eu tenho de passar na casa de uma amiga agora... brigada. Tchau!

E depois desse dia a gente só se viu na semana seguinte, que era a semana das provas. E depois vieram as férias. E aí veio o terceiro ano do colégio. E lá estava ele outra vez... E eu fiz a merda de dar pra ele... Primeira vez minha... e dele! Mas só ficamos mais umas duas ou três vezes depois disso. Acabou o Ensino Médio. Cada um foi prum lado.

Nunca mais o vi.

Ou melhor. Vi sim. Uma vez, no shopping. Na fila do cinema, com uma menina. Blé.

Esses dias, resolvi procurar por ele no Orkut. Assim... procurar por procurar... Nem queria sair com ele de novo nem nada... procurei porque eu lembrei... E sim: ele estava lá. Deixei um scrap falando oi e perguntando se ele lembrava de mim. Aí ele me mandou um e-mail. Eu mandei outro. Só que eu mandei do meu e-mail da empresa, que tem minha assinatura eletrônica com telefone, fax, e-mail e o caralho a quatro...

Foi então que ele me ligou.

E logo depois de eu falar “Comercial, Endora”, eu ouvi do outro lado da linha:

Ele: “Olá!!! Ainda quer uma música de presente?”