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14.4.04


UNTITLED. AGAIN

E você sente que não basta acordar e se levantar da cama. Porque o dia está frio e chuvoso e tudo o que você queria era apenas mais alguns minutos de sono.

E você sente que seria bem melhor se o seu banho normal de todos os dias lavasse também o corpo por dentro e que, junto com a água, se fossem as mágoas, as angústias, a tristeza... todas em tons púrpura, descendo pelo ralo abaixo.

E você sente que a comida do seu café da manhã também poderia alimentar seu coração. E que toda vez que você começasse a sentir aquele vazio no peito, um simples pacote de biscoitos já seria capaz de resolver seu problema.

E você sente que sua vida seria muito mais alegre se, por todos os lugares se fizesse ouvir aquela música que não sai da sua cabeça e da qual você gosta tanto. A música que poderia ser a trilha sonora da sua vida. Para que ela não ficasse só na sua mente, como se fosse um rádio egoísta de uma música só. E assim, todos poderiam saber quão legal é caminhar cantando “We all needed something to cling to, so we did”...

E você sente que o seu dia de trabalho poderia se tornar especial se você abrisse a sua caixa de entrada e visse “aquele” e-mail, “daquela” pessoa, te falando “aquela” coisa.

E você sente que, por mais que a vida te prove por A + B que não se deve fazer aquilo, você vai lá e continua fazendo, contrariando as leis da lógica e batendo com a cabeça na parede por ser a mais teimosa das teimosas.

E você sente que não deve planejar as coisas que não dependem exclusivamente de você, mas é como se elas se auto-planejassem e se infiltrassem na sua mente, fazendo você imaginar o quão legal pode ser o seu fim de semana se aquilo tudo realmente acontecer daquele jeito. Mas no fundo você entende que não deve criar as expectativas de sempre, que as coisas não vão acontecer daquele jeito. E mais uma vez você vai ficar frustrada e achar que o problema de tudo está em uma única pessoa: você mesma.

E você sente que é capaz de fazer coisas difíceis como dizer um “não” para aquele cara que você sempre quis que te chamasse pra sair, mas ainda não consegue alcançar objetivos fúteis como, por exemplo, entrar em uma calça manequim 38.

E você sente que há tanto dentro de você para ser dividido, mas que, desafortunadamente, não consegue encontrar alguém que mereça ter um pedacinho de você para si mesmo.

E você sente que está rodeada de pessoas sanguessugas, que são verdadeiros urubus, que te enxergam como a própria carniça. Achando que você está ali para ser mastigada, devorada e digerida enquanto apodrece.

E você sente que queria tanto ser outra pessoa, com outra aparência, outra personalidade, outro jeito de ver a vida. Que ser como você é tem doído tanto, tem provocado tanto sofrimento, tanta angústia, que você não sabe mais se vale a pena ser assim...

E você sente que cansa esconder seus sentimentos atrás de uma aparência sempre vibrante, sorridente e estável. Você é a própria bela viola por fora. E um pão mais que bolorento por dentro.

E você sente que é hora de fechar os olhos. Porque mais um dia acabou. Mesmo sendo apenas três da tarde.