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16.10.04


Se conheceram em uma sala de reuniões. Trabalhavam há algum tempo no mesmo escritório, mas jamais haviam conversado. O contato se restringia a um "bom dia" ou "boa tarde". Mas naquele dia, ali, na sala de reuniões, estavam lado a lado.

O Tédio foi o fator predominante para o início daquela amizade. Sonolentos e embriagados pela mesmice daquela situação, passaram três horas brincando de jogo da velha, desenhando os participantes e contando piadas. Tudo, através do bloco de anotações que cada um trazia.

Resolveram almoçar juntos. Ela soube que ele era noivo. Ele soube que ela tinha um namorado ciumento. Começaram a falar sobre relacionamentos. Começaram a entender que todos sofriam as mesmas conseqüências por amar. Cada um à sua maneira.

A troca de e-mails entre os dois passou a ser constante. Entre uma pausa e outra no expediente, iam tomar um café, fumar um cigarro e confessar seu dia nesses poucos minutos.

Tornaram-se grandes amigos. Foram cinco anos trabalhando juntos. Nesse tempo, puderam compartilhar o término do namoro de um e de outro, as desilusões amorosas, as angústias, as tristezas, os problemas na família. Sim. Eram agora, grandes amigos de verdade.

Quando ela saiu da empresa, ele foi ao banheiro e chorou um pouco. Ela, deixou pra ele mais que um e-mail de despedida. Deixou o coração em forma de código binário.

Continuaram se falando, continuaram saindo juntos para tomar cerveja, continuaram compartilhando suas descobertas e desilusões. Ele dava conselhos duros e ela também. Mas também faziam carinho um ao outro, em forma de palavras.

Dez anos se passaram e ainda eram amigos. Um dia, numa conversa de mesa de bar, ela lhe revelou que queria muito um filho. E que queria que ele fosse o pai. Não por estar apaixonada por ele ou coisa do tipo. Ela já tinha pouco mais de 30 anos e ainda não havia encontrado alguém que realmente pudesse amá-la. Ele também era um grande boêmio e se envolvia com garotas aqui e ali, mas nada sério.

A princípio ele ficou assustado, mas ela disse que queria apenas realizar o sonho de ser mãe. E se fosse esperar o cara certo, provavelmente, chegaria na menopausa e ainda assim, não teria um bebê. Ele, pensou na própria vida e percebeu também que já chegara aos trinta anos e ainda não tinha um rumo certo a seguir. Também queria ser pai, mas não acreditava que nenhuma das mulheres com quem saía, poderia ter o papel de mãe de seu filho.

Gostou da idéia. Ela, era uma pessoa que adorava, que amava como uma irmã. Disse que sim e se abraçaram, felizes em saber que fariam agora, algo que realmente ia valer a pena.

Mas então surgiu o problema: eram amigos demais para realizarem o ato sexual. Ela já dava risadas só de pensar. Ele, sentia que não teria condições psicológicas sequer de ficar no estado que permitiria a cópula.

Fazer inseminação artificial era loucura. Um procedimento muito caro para os ganhos de cada um. Tiveram uma idéia.

Ao chegar no motel, retiraram as garrafas de vodka de dentro do carro e subiram para o quarto. Ligaram a TV e brigaram um pouco na hora de ligar o rádio, já que o gosto musical de ambos era bem distinto. Pegaram copos e gelo. Começaram a competir para ver quem bebia mais. Sim, pois bêbados, conseguiriam fazer sexo, mesmo que rápido e de qualquer jeito, para que ela engravidasse e, assim, pudessem realizar o feito planejado.

Já haviam acabado com uma garrafa. Restavam duas. Ela bebeu mais e ria descontroladamente. Ficou nauseada. Foi vomitar no banheiro. Ele, resolveu pedir dois hambúrgueres. Os dois pra ele, claro. Voltaram a beber.

Duas horas e meia depois, encontravam-se completamente embriagados. Ele olhou pra ela e disse que nada nesse mundo era mais importante do que tê-la como amiga. Ela sorriu e disse o mesmo. Se abraçaram.

Entenderam que o amor nunca vai atingir a perfeição da amizade. E dormiram bêbados, um ao lado do outro.